A Dengue é uma infeção provocada por um vírus introduzido no organismo humano através da picada de mosquitos fêmea do género Aedes, infetadas com o vírus.
Este mosquito é frequentemente encontrado em regiões tropicais e subtropicais, no entanto, a sua propagação pelo mundo e pelo sul da Europa tem sido notória, estabelecendo-se, nos últimos anos, em países como Itália, França e Espanha.
Em Portugal continental, o mosquito foi identificado, pela primeira vez, em 2017, na região Norte, em 2018 na Região do Algarve e em 2022 no Alentejo. Apesar disso, todos os casos registados em Portugal foram importados.
O que é a Dengue?
A transmissão da Dengue acontece exclusivamente através da picada do mosquito fêmea Aedes infetado com o vírus. A doença não é contagiosa, ou seja, não se transmite de pessoa para pessoa, além de também não ser transmitida através do consumo de alimentos ou água.
Existem relatos de transmissão de mãe para filho durante a gravidez, embora esta via de transmissão seja pouco frequente.
O vírus da Dengue (DV) é um flavivírus de distribuição global, composto por 4 serotipos distintos (DV-1, -2, -3, -4). É possível contrair dengue até 4 vezes, uma vez que adquirimos imunidade pós-infeção a cada serotipo, mas a infeção com um serotipo não gera imunidade contra os restantes.
Os sintomas dos vários serotipos de dengue são similares, mas com cada nova infeção, estes podem tornar-se mais intensos e o risco de desenvolver dengue hemorrágica aumenta. Por isso, é extremamente importante evitar novas infeções.
Estima-se que cerca de 2,5 a 3 biliões de pessoas residam em áreas propícias à contaminação por este vírus, existindo de 100 a 200 milhões de casos de infeção e 30.000 mortes anuais decorrentes da doença.
Como identificar o mosquito?
Os mosquitos adultos são pretos com manchas brancas ou prateadas, nomeadamente na zona dorsal do tórax.
A picada poderá não se distinguir das outras, e é geralmente indolor, no entanto, a DGS descreve-a como “agressiva”, provocando geralmente uma “reação exuberante”.
Principais sintomas de dengue
A Dengue possui um período de incubação que varia de 3 a 7 dias, mas que se pode prolongar até 14 dias.
A maioria dos indivíduos infetados pela primeira vez desenvolvem formas ligeiras da doença ou não manifestam sintomas. No entanto, nos casos de infeções seguintes existe um risco aumentado de desenvolver formas mais graves da doença.
A doença pode assumir duas formas: o Dengue clássico e o Dengue hemorrágico (forma mais grave, que pode ser fatal).
A maioria dos indivíduos que desenvolve a forma clássica, pode apresentar sintomas como:
- Febre alta;
- Dores de cabeça fortes;
- Dor ocular “atrás dos olhos”;
- Dores ósseas, nos músculos e articulações – “febre quebra ossos”;
- Vómitos;
- Surgimento de manchas vermelhas na pele (mais frequentemente observada em crianças);
- Hemorragias ligeiras.
A doença pode, ocasionalmente, apresentar sinais e sintomas de meningite ou encefalite. Na grande maioria dos casos, a diminuição da febre sinaliza a resolução da doença. No entanto, crianças e jovens adultos apresentam um risco aumentado de progressão para febre hemorrágica e síndrome do choque da dengue, especialmente em casos onde existe uma infeção repetida por um novo serotipo do vírus. Podem ocorrer vómitos, tonturas, dificuldades respiratórias, dores abdominais intensas, sangue nas fezes. Esta situação é uma emergência médica que necessita de cuidados especializados imediatos.
Como é realizado o diagnóstico?
A deteção dos anticorpos IgM e IgG específicos para dengue é o método diagnóstico mais frequentemente utilizado. A seroconversão (o intervalo de tempo durante o qual um anticorpo específico se desenvolve como resposta a um antigénio e se torna detetável) ocorre geralmente 3 a 7 dias após a exposição ao vírus, podendo ser necessário realizar testes serológicos agudos e convalescentes, de modo a estabelecer um diagnóstico definitivo.
Como complemento ao teste serológico, a identificação precoce da infeção pode ser realizada através da deteção do antigénio da proteína não estrutural 1 (NS1) do vírus. A presença de antigenemia NS1 pode ser observada cerca de 24 horas após a infeção e até 9 dias após o início dos sintomas.
Conforme as recomendações do CDC (Centro de Controlo e Prevenção de Doenças), é aconselhável a realização de testes para o vírus da dengue em:
Qualquer pessoa que viva ou tenha viajado para áreas onde o vírus é transmitido, e que tenha apresentado recentemente sinais e sintomas compatíveis com a doença, nomeadamente febre, dor de cabeça, erupção cutânea, dores no corpo e manifestações hemorrágicas, podendo variar de leves a graves.
O teste para o vírus da dengue não é recomendado para:
- Pacientes assintomáticos;
- Triagem pré-concepcional.
Pacientes com sintomas consistentes com os da Dengue podem ser submetidos a testes utilizando métodos de diagnóstico molecular e serológico durante a fase aguda da doença, ou seja, os primeiros 7-9 dias da mesma. Após esse período, recomenda-se apenas a realização de testes de diagnóstico serológico.
Orientações para diagnóstico laboratorial
Fase aguda: 1-7/9 dias após início dos sintomas
- Durante este período, o vírus geralmente está presente no sangue ou em fluidos derivados do sangue, como soro ou plasma;
- O RNA do vírus da Dengue pode ser detetado com testes moleculares (NAAT);
- A proteína não estrutural NS1 é uma proteína do vírus da dengue que também pode ser detetada por alguns testes comerciais (antigénio);
- Um resultado negativo de um teste molecular ou de NS1 não é 100% conclusivo;
- Para pacientes sintomáticos durante os primeiros 1-7 dias da doença, devem ser realizados testes de NAAT ou NS1 + Anticorpos IgM;
A associação de NS1/NAAT + IgM permite detetar mais casos e geralmente permite o diagnóstico com uma única amostra.
- A presença do antigénio da proteína não estrutural 1 (NS1) da dengue é consistente com a fase aguda da infeção. O antigénio NS1 é tipicamente detetável 1 a 2 dias após infeção e até 9 dias após o início dos sintomas;
- O antigénio NS1 também pode ser detetado durante a infeção secundária pelo vírus da dengue, mas por um período mais curto (1-4 dias após o início dos sintomas);
- A ausência do antigénio NS1 da dengue é consistente com a ausência de infeção na fase aguda. O antigénio NS1 pode ser negativo se a amostra for colhida imediatamente após a infeção pelo vírus da dengue (<24-48 horas) e raramente é detetável após 9 a 10 dias de sintomas.
Interpretação dos resultados dos testes:
• Teste NAAT ou NS1 positivo para dengue – diagnóstico de dengue confirmado;
• Resultado do NAAT/NS1 negativo e anticorpo IgM positivo – diagnóstico laboratorial presuntivo de infeção pelo vírus da dengue.
Fase de convalescença: >7/9 dias após o início dos sintomas
- Durante a fase de convalescença, os anticorpos IgM geralmente estão presentes e podem ser detetados por um teste de anticorpos IgM;
- Os anticorpos IgM tornam-se detetáveis 3 a 7 dias após a infeção e podem permanecer detetáveis até 6 meses ou mais após a resolução da doença;
- Os pacientes com anticorpos IgM contra o vírus da dengue e com: 1) um resultado negativo de NAAT/NS1 na amostra de fase aguda, ou 2) sem uma amostra de fase aguda, são classificados como tendo uma infeção recente e presumida pelo vírus da dengue;
- A presença de anticorpos da classe IgG para o vírus da dengue (DV) é consistente com a exposição ao vírus em algum momento no passado.
- 3 semanas após a exposição, a maioria dos indivíduos imunocompetentes desenvolvem anticorpos IgG,
- A ausência de anticorpos da classe IgM é consistente com a ausência de infeção. No entanto, amostras colhidas logo após a exposição podem ser negativas para anticorpos IgM. Perante suspeita de DV, deve ser testada uma segunda amostra colhida aproximadamente 10 a 12 dias após a exposição.
Considerações especiais:
Os resultados dos testes devem ser usados em conjunto com a avaliação clínica, incluindo histórico de exposição e apresentação clínica.
Reatividade cruzada: a reatividade cruzada é uma limitação dos testes serológicos de Dengue, principalmente dos anticorpos IgG. Testes serológicos para detetar anticorpos contra outros flavivírus (como encefalite japonesa, encefalite de St. Louis, vírus do Nilo Ocidental, febre amarela e vírus Zika), podem reagir de forma cruzada com os vírus da dengue. Esta limitação deve ser considerada para pacientes que moram ou viajaram para áreas onde outros flavivírus co-circulam.
No caso de grávidas com suspeita de infeção, recomenda-se a realização adicional de teste para Zika (Biologia Molecular ou Serologia), para além de Dengue.
Embora muito incomuns, resultados falso-positivos da proteína não estrutural 1 (NS1) podem ocorrer em indivíduos com infeção ativa devido a outros flavivírus, incluindo o vírus do nilo ocidental e o vírus da febre amarela.
Resultados negativos do antigenio NS1 podem ocorrer se a amostra foi colhida mais de 7-9 dias após o início dos sintomas. A realização de teste serológico para anticorpos IgM e IgG para o vírus da dengue é recomendado nestes casos.
Tratamento
Não existe nenhum tratamento específico para combater a doença, sendo necessário o acompanhamento médico, repouso e ingerir muitos líquidos para evitar desidratação.
Devem ser tomadas medidas adicionais para prevenir a propagação da doença, sobretudo nas pessoas que habitam a mesma casa, uma vez que se o mosquito picar o doente pode transmitir o vírus a outra pessoa saudável.
Para prevenir a infeção pelo vírus, é recomendada a toma da vacina para pessoas entre os 6 e os 45 anos, que vivam em zonas de risco e que tenham tido uma infeção prévia pelo vírus da Dengue.
De que forma se pode prevenir a contaminação pelo vírus da Dengue?
A principal forma de prevenir a infeção pelo vírus da Dengue é protegendo-se contra a picada do mosquito.
Quem se encontrar numa região considerada de risco deve adotar os seguintes comportamentos:
- Aplicar repelente de mosquitos, nas áreas expostas, principalmente manhã e à noite, período mais ativo do mosquito, embora possam estar ativos a qualquer hora do dia, sobretudo dentro de casa;
- Evitar a acumulação de água em objetos e espaços parados;
- Usar roupas largas, que cubra grande parte do corpo;
- Utilizar redes mosquiteiras;
- Ter atenção às orientações dadas pelas autoridades de saúde locais.
A Dengue representa uma preocupação significativa para a saúde pública, especialmente em áreas onde as condições favorecem a proliferação do mosquito vetor e a transmissão do vírus.
Em 2005, o mosquito foi detetado, pela primeira vez, na ilha da Madeira e em 2012 houve um surto, que resultou em mais de 2 mil casos.
Nos últimos anos, os números de infeções por dengue têm aumentado em Portugal. Segundo a DGS, entre 2015 e 2023, foram notificados 136 casos, mas todos importados. Atualmente, não existe razão para alarme, uma vez que não existe evidência de transmissão autóctone em território nacional.
No entanto, uma vez que o mosquito está presente no nosso território é importante ter conhecimento sobre os sinais e sintomas e estratégias de prevenção.
Especialmente para quem vai viajar para o Brasil, ou outros países da América do Sul e África Subsaariana, é recomendada a marcação de consulta do viajante, a adoção de estratégias de prevenção e uma atenção redobrada o surgimento de sintomas de febre, calafrios, dores de cabeça e oculares e cansaço acentuado.
Além da dengue, é essencial estar atento a outras condições que exigem vigilância pública, como a Doença dos Legionários. Saiba mais sobre esta condição, incluindo suas causas e modos de transmissão, no nosso artigo: Legionella: o que é e como é transmitida?
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